Penso que em muitos momentos é particularmente difícil falar de um amor, não por conta do próprio ente amado, mas pelo quanto esse amor revela de nós mesmos. A declaração é um desnudar-se, revelar-se, deixar as coberturas e proteções para confiar o conhecimento de sua essência a outro alguém. Será recíproco? Serei ferido ou acolhido? Com que grau de confiança me achego para nos colocar em contato, em sentidos compartilhados? Talvez seja sempre um risco. De fato! Mas no fundo tão desejado que mensurar o custo de nossa aproximação talvez seja absurdez. Desacerto certo.
Que força é essa a me impulsionar a tal ponto, a tamanha coragem, quase um desapego doador? Que ser amado tão magnético em suas ondas me provoca essa ousadia quase irresponsável da entrega confiante?
É que em você conheço e sou conhecido, me conheço, reconheço e me torno um pouco mais sabedor de tudo, do cosmos, de nós, ao mesmo tempo que me sei pouco ciente, quase nada versado diante da imensidão. E mesmo das coisas pequeninas, se é que podemos desmedir assim qualquer elemento, mesmo dessas, não sei como convém. Mas se vida é jornada, o amor é verbo, caminhante e atuante. Ação em direção. A aventura de nossas recíprocas descobertas me abastece e impulsiona. E que deleite em nosso amor, que deleite em te amar.
Não me abstenho de dizer que por tantas vezes nos estranhamos. Quase não suportamos um ao outro e nos ferimos, assim mesmo, mutuamente. Mas isso não seria o afiar dos metais? Ao passo que em nossos desatinos, a ferida e a cura se dão no mesmo lugar, em nossa relação. Aprendemos a nos amar e amamos no presente contínuo. Somos no momento presente e juntos.
Me achegar a você é um deleite, com certeza! Mas os momentos em que estamos juntos não são sempre fáceis, pois como já te disse, te conhecer me revela. Você me desafia e eu me apaixono, contudo, ás vezes suas verdades suavemente ditas ou incisivas e abruptas tocam em sensibilidades que gostaria de preservar. Mesmo que saiba e deseje que sejam tratadas. Tipo quando escondia o joelho ralado, mas sabia que precisava do remedinho ardido. Lembra de quando te contei sobre isso?
Bem! Somos um para o outro isso, um eterno retorno. Não é possível existir farsa entre nós, você fala demais… e fala com verdade. Nem sempre com clareza. Me esforço para te desvendar quando deseja não ser óbvia. Fico chocado quando é brutalmente clara, ou cândida, ou atrevida. Você tem muitos humores e se veste para muitas ocasiões. Que encanto! Que receio! Sempre cativante ao final, ainda que nunca estou bem certo o que vem me oferecer.
Já me frustrei e até odiei algumas de suas performances. Como pôde! Ora, por favor caia em si! Não se permita tamanho desatino. Meu zelo por ti não suporta ver-te assim. Que articulações mal elaboradas, que verbetes são esses? Quem poderia, quem poderia! Não! Venha cá. Vamos conversar novamente. E em instantes de imersão nos reconciliamos. Nós descobrimos e afeiçoamos. Em jornada seguimos e aperfeiçoamos nossa relação.
Misteriosa e cativante,
Faceira e indolente.
Me instiga conhecer-te e cuidar-te,
Literatura, como eu amo o seu flerte!